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leitura a dois:
pintando o som das palavras

Um projeto de

Thais Sehn & Molly Briggs

 

Este projeto é fruto de uma colaboração entre a Prof. Molly Briggs e a estudante visitante Fulbright Thaís Sehn na Primavera de 2019. A pesquisa de doutorado de Sehn combina métodos das Ciências Sociais e do Design Visual, tem o objetivo de analisar o efeito dos adultos lendo em voz alta uns para os outros. O trabalho de Briggs investiga a associação do movimento dos grandes parques do século XIX com textos e imagens imersivos sobre paisagem do período. Para este trabalho, foi explorada a experimentação unindo o período da bolsa de estudos, com a prática de estúdio e a leitura em voz alta. Cada uma selecionou diferentes textos para lerem e ouvirem juntas, alternadamente uma delas seria a leitora e a outra desenharia enquanto ouvia o texto. Os desenhos assumem a forma de páginas espelhadas, exceto no caso dos Capitães da Areia, onde trabalharam diretamente no livro. Juntos, textos e imagens constituem uma troca meditativa de consciência cultural, pessoal, artística e acadêmica.

leitura a dois:

pintando o som das palvras

Texto de Thais Sehn

QUANDO SE LIA PARA O OUTRO, A VOZ SE TRANSFORMAVA EM CORES QUE PENETRAVAM NO PAPEL. A leitura deixava de ser um diálogo solitário entre o leitor e o autor e se transformava em  uma experiência sensorial que envolvia, além de todos os próprios sentidos, o outro.

Desenhar sobre as palavras criava um rastro que evidenciava a leitura sendo consumida, ressaltando a sobreposição de autores, leitores, ouvintes, ideias, pontos de vista...  A voz se misturava às músicas instrumentais ao fundo; a garganta era aquecida pelo chá de gengibre e o final da página era acompanhado pelo som do secador, que tornou-se um mal necessário para fixar a tinta na folha e permitir que a leitura seguisse adiante.

Este  som num primeiro momento parecia um intruso, mas depois, percebeu-se que do mesmo modo que ele ofuscava a voz de quem lia, o texto também  era “ofuscado” pela tinta do pincel daquele que ouvia. De forma translúcida, ambos interferiam na mensagem e, ainda assim, permitiam que ela alcançasse o receptor final.

AS ESCOLHAS

Para realizar o projeto, foi combinado que cada uma escolheria uma leitura e o suporte a ser pintado. Thaís Sehn escolheu um clássico brasileiro - CAPITÃES DA AREIA - de Jorge Amado (1937), história que traz como protagonistas crianças abandonadas que sobrevivem nas praias da Bahia à sua maneira. Providenciou dois volumes iguais do livro, e o ouvinte interviria em sua própria cópia, demarcando visualmente as páginas lidas e ouvidas.

 

Molly Briggs escolheu três partes de livros que se relacionam entre si: LIGHT AND COLOR IN THE OUTDOORS (Luz e cor nos espaços abertos), de Marcel Minnaert (1937); KIJKDUIN (Visualizando a duna), de James Turrell (1996); e sua própria tese de doutorado,  THE PANORAMIC MODE (O modo panorâmico, 2018). Minnaert foi um cientista natural que falava sobre a atenção aos fenômenos da luz, tão visíveis no nosso cotidiano, que acabam por se tornar invisíveis. Em Turrell é possível descobrir mais sobre a sua instalação artística Kijkduin, a qual foi criada com inspiração  na teoria de Minnaert, e Briggs aborda os panoramas, fazendo referência aos dois livros anteriores. Nas leituras escolhidas por Molly, foram testadas intervenções em cópias dos livros em tamanho grandes e convencionais e, no fim, a maioria foi feita em folhas em branco de grande formato. 

Escolhas tão diferentes, de pessoas que ainda não se conheciam, acabaram  tornando-se uma unidade, um grupo, devido a uma circunstância particular. Motivadas por uma vontade de voltar aos pincéis e pelo gosto à leitura, as duas embarcaram no desconhecido para descobrir juntas o que poderia acontecer.

OS ENCONTROS

Através desses encontros, no mesmo momento que Minnaert estava na prisão, a polícia tentava encontrar os capitães das areias no livro de Amado. O fenômeno do sol, atravessando as folhas das árvores, observado pelo cientista natural, criava a sombra nas docas que escondia os meninos.

 

Enquanto Turrell nos conduzia por suas escolhas artísticas, incluindo experimentos científicos com fogo para descobrir chamas coloridas, o Carrossel chegava à cidade, colorindo a vida daquelas crianças. Amado mostrava que apesar da vida de crimes e escolhas erradas, eles queriam apenas uma família para amar.

Junto com o texto de Briggs vem o deleite com o Panorama: um espaço projetado nos mínimos detalhes para criar a ilusão de outro lugar. Desde a pintura, a curva da tela, a distância para observação... até areia de verdade foi adicionada ao local para se misturar com a imagem pintada! O encantamento com um projeto tão minucioso foi seguido por uma tristeza coletiva, ao se deparar com o fato de que o panorama foi cortado em pedaços e apenas uma parte dele é exibido no museu, totalmente fora de seu contexto inicial. A mesma mudança de emoções foi repetida na narrativa de Amado. Após o capítulo do Carrossel, que foi um ponto de felicidade na vida dos pequenos capitães, Pedro Bala desfez em pedaços a alma de uma personagem nas areias – agora imaginárias – da praia da Bahia.

 

Leituras tão diferentes, baseadas em realidades tão distantes: os fenômenos da luz e da visualização, lado a lado com o cenário marginalizado de uma cidade brasileira, apesar de  tão longínquas, tornam-se tão próximas, cheias de cruzamentos e aproximações, pelo simples motivo de terem sido lidas juntas.

 

A leitura a dois oportunizou o descobrimento de mundos diferentes: mundos de palavras, cores, sons e, principalmente, sensibilizações... sensibilizações com o outro, e não apenas com os autores dos textos escolhidos, mas com o outro presente ali, naquele momento:  que lia, ouvia, sentia, comentava, desenhava, pintava, contava, explicava, percebia, admirava... permitindo que as palavras lidas em voz alta passeassem pela sala, retornassem aos nossos corpos através dos ouvidos e descansassem no papel através de nossas mãos.

O resultado desse experimento pode ser visto na exposição “2019 School of Art + Design Faculty Exhibition”, no Krannert Art Museum, em Urbana-Champaign (Illinois, EUA), dos dias 31 de Outubro de 2019 a 7 de Dezembro, e nas fotos publicadas neste site.

Reading together

31.out.2019 - 7.dez.2019

Krannert Art Museum (KAM) - Main Level, East Gallery

University of Illinois at Urbana-Champaign

abertura

31.out.2019 - 5–7 pm
Link Gallery/Krannert Art Museum

Main Level, East Gallery

Exhibition
Pictures
Lendo Amado juntas
Lendo Turrell juntas
Lendo Briggs juntas
Lendo Amado juntas
Lendo Briggs juntas
Lendo Amado juntas
Lendo Briggs juntas
Lendo Turrell juntas
Lendo Amado juntas
Lendo Briggs juntas
Lendo Briggs juntas
Lendo Amado juntas
Lendo Amado juntas
Lendo Turrell juntas
Lendo Amado juntas
Lendo Amado juntas
Lendo Amado juntas
Lendo Briggs juntas
Lendo Amado juntas
Lendo Briggs juntas
Lendo Amado juntas
Lendo Briggs juntas
Lendo Minnaert juntas
Lendo Amado juntas

artistAs

Molly Catherine Briggs

Molly Catherine Briggs é uma teórica do design, estudiosa da paisagem e artista de estúdio. Sua pesquisa é uma junção da teoria com a prática criativa. Ela ensina Teoria, Métodos e História do design, com ênfase na Leitura, Representação e Reimaginação da forma e do espaço construído. Possui mestrado em Teoria e Prática da Arte pela Northwestern University e doutorado em História e Teoria da Arquitetura da Paisagem em Illinois. Sua dissertação, The Panoramic Mode: Immersive Media and the Large Parks Movement (2018), examina a afiliação de grandes paisagens de parques urbanos na Europa e nos Estados Unidos com mídias de realidade virtual do século XIX.

 

Prof. Dra. Briggs recebeu inúmeras bolsas, prêmios e reconhecimentos acadêmicos, criativos e pedagógicos. Atualmente, atua no Conselho do International Panorama Council (2018-2021) e é membro da College Art Association e da Society of Architectural Historians. Ela é representada pela Zg Gallery em Chicago desde 2004.

 

Interesses de pesquisa: ambiente construído, mídia imersiva, cultura visual e teoria do design.

 

https://mollybriggs.net/home.html

Artists

Thaís Cristina Martino Sehn

 

Thais Sehn é doutoranda em Design na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com período sanduíche na University of Illinois at Urbana-Champaign (UIUC) financiado pela Fulbright, onde trabalhou com o Stan Ruecker e conheceu a Molly.

Este projeto faz parte da tese de doutoramento de Thaís, na qual ela está pesquisando como o design pode melhorar a experiência de leitura oral para o ouvinte adulto. Através de sua pesquisa ela acredita ser possível auxiliar as pessoas a se conectarem umas com as outras por meio do livro e, assim, fortalecer seus vínculos afetivos através da leitura.

 

Anteriormente, já atuou como professora nos cursos de Design da Unversidade Federal de Pelotas (UFPel) e de Publicidade e Propaganda na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).

 

Trabalha como designer gráfica em seu escritório Âme Studio Criativo desde 2015.

 

Como pesquisadora atua nas áreas do Design Editorial, Memória Gráfica e Design Emocional.

https://www.linkedin.com/in/thaissehn

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